Duquesa de Bourbon e o Auge das Lojas de Adoção
A primeira mulher a ser iniciada em uma loja maçônica masculina foi Elizabeth Aldworth (cerca de 1695 e 1773, Irlanda). Ela não fez parte de uma "loja feminina" formal, pois tais estruturas ainda não existiam, e sua história carece de documentação detalhada.
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Entre Elizabeth Aldworth e a criação das primeiras Lojas Mistas, surgiu, no final do século XVIII, na França, segundo alguns registros, a experiência das Lojas de Adoção (Lodges d'Adoption). Estas são consideradas as primeiras formas organizadas de participação feminina na Maçonaria. Foram criadas para permitir que mulheres ligadas a maçons - esposas, irmãs ou filhas - participassem dos rituais e da vida maçônica, ainda que sob supervisão masculina. O termo "adoção" refletia a ideia de que a mulher era simbolicamente incorporada à Loja Masculina.
As Lojas de Adoção possuíam ritos próprios, adaptados da tradição maçônica, com graus, símbolos e alegorias morais, muitas vezes inspiradas na mitologia clássica. As mulheres podiam exercer funções de liderança, sendo a figura máxima conhecida como Grande Maîtresse (Grã-Mestra), que presidia a loja e simbolizava a autoridade feminina dentro do rito de adoção.
Há indícios de que a primeira Loja de Adoção tenha sido fundada em Bordéus (Bordeaux, em francês), que fica no sudoeste da França, na região da Nova Aquitânia (Nouvelle-Aquitaine) - por volta de 1730, sob os auspícios da Loja L'Anglaise. Esse fato foi identificado em documentos históricos recuperados chamados "arquivos de Moscou", apreendidos pelos nazistas na Segunda Guerra e posteriormente restituídos às Grandes Lojas francesas. Outros autores, contudo, atribuem a primeira fundação à Loja De Juste, em Haia (c. 1751).
A Duquesa de Bourbon, Maria Teresa Luísa de Saboia-Carignano, foi instalada com grande pompa e esplendor entre 1773-1775, na Loja de Adoção Saint-Jean de La Candeur, localizada na sala de Folie-Titon, em Paris. Este evento marcou sua ascensão como a primeira mulher a receber o título de Grã-Mestra em uma estrutura maçônica reconhecida na França. Durante o período em que presidiu a Loja de Adoção La Candeur, até cerca de 1780, desempenhou um papel fundamental na consolidação da Maçonaria Feminina, incentivando a criação de novas Lojas e promovendo maior participação das mulheres. Sua atuação foi decisiva para o fortalecimento e a legitimação das práticas femininas dentro do universo maçônico.
Além de sua atuação na Maçonaria, a Duquesa de Bourbon manteve contato com a rainha Maria Antonieta nos círculos da corte francesa. Era conhecida por seu interesse pelo Iluminismo e pelo apoio à instrução feminina. Sua liderança na maçonaria inspirou gerações de mulheres a se envolverem na Ordem e a contribuírem para a promoção dos valores maçônicos.
Também se destacaram a Loja de Adoção La Parfaite Égalité e, por associação simbólica, a famosa Loja Mista Les Neuf Soeurs (Paris, 1776). Embora esta última fosse predominantemente masculina, seu nome e prestígio foram ligados simbolicamente à presença feminina.
Entre as mulheres que participaram dessas experiências pioneiras, várias pertenciam à elite parisiense do final do século XVIII. Elas exerciam funções de liderança simbólica nas lojas de adoção, embora seus nomes raramente apareçam em registros históricos detalhados.
Reconhecimento e Expansão
Em 1774, o Grande Oriente da França regulamentou oficialmente as Lojas de Adoção, reconhecendo uma prática que já existia havia cerca de 30 anos. Um levantamento feito pelas historiadoras Margaret Jacob e Janet Burke identificou a existência de cerca de 25 Lojas de Adoção na França, um número expressivo. As mais prestigiadas chamavam-se La Sincérité e La Candeur, ambas em Paris.
Essas Lojas eram frequentadas por mulheres da alta nobreza da corte, como a Princesa de Lamballe, documentada como Venerável Mestra da Loja de Adoção vinculada à Loja Mãe Escocesa Le Contrat Social. Segundo a Grande Loja Simbólica da Lusitânia (2018), a Imperatriz Josefina atuou como Grã-Mestra das Lojas de Adoção Regular da França entre 1804 e 1815, promovendo a criação de lojas femininas paralelas às masculinas, com o objetivo de incluir mais mulheres na maçonaria. No entanto, alguns historiadores contemporâneos consideram essa informação pouco confiável.
O Declínio e a Retomada
Em 1808, durante o Império Napoleônico, o Grande Oriente da França suprimiu oficialmente as Lojas de Adoção, que já vinham perdendo vigor. Elas retomariam apenas em 1893, com a fundação da Ordem Mista Le Droit Humain, criada por Georges Martin e Maria Deraismes, feminista comprometida com a emancipação feminina. Deraismes havia sido iniciada em 1882 na Loja Les Libres Penseurs, em Le Pecq. Suas ações na Maçonaria influenciaram Annie Besant, teósofa e feminista responsável por fundar a primeira Loja Le Droit Humain em Londres, em 1902.
As Lojas de Adoção na Atualidade
Atualmente, algumas Lojas de Adoção ainda existem em jurisdições históricas, sobretudo na França, mas em muitos casos funcionam como organizações mistas ou femininas independentes, dedicadas à preservação de tradições, educação moral, estudo simbólico e ações filantrópicas. Diferentemente do modelo original, que colocava as mulheres sob supervisão masculina, essas Lojas modernas oferecem autonomia plena às participantes, refletindo a evolução da Maçonaria Feminina e Mista ao longo dos séculos.
Assim, as Lojas de Adoção - juntamente com ordens correlatas, como a Ordem da Estrela do Oriente - representam um elo entre a tradição histórica da participação feminina e as formas contemporâneas de maçonaria, consolidando um espaço ritualizado, educativo e socialmente relevante para mulheres dentro da tradição maçônica.
Conclusão
Em termos cronológicos, percebe-se uma linha de desenvolvimento clara: de Elizabeth Aldworth, que representou a admissão individual e excepcional de uma mulher, às Lojas de Adoção francesas, que criaram um modelo coletivo e ritualizado de participação feminina; até figuras do século XIX como Maria Deraismes, Marie Béquet de Vienne e Annie Besant, que estabeleceram organizações mais estruturadas, com ritos próprios e reconhecimento internacional.
Assim, as Lojas de Adoção ocupam uma posição intermediária e essencial na história da mulher na maçonaria: não eram independentes como as Lojas Femininas Modernas, mas foram o primeiro espaço sistemático e ritualizado onde mulheres puderam participar, liderar e influenciar a tradição maçônica.
Sandra Cristina Pedri
Referências Bibliográficas
FREEMASON. Cronologia Maçônica - 2a Parte - 1717 a 1812. Disponível em: https://www.freemason.pt/cron-mac2. Acesso em 27 set. 2025.

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